Quinze garotinhas gritavam em torno do grupo musical adolescente.Os quatro eram o sucesso internacional do momento. E acabavam de se arrumar para mais um show,quando as mocinhas,sorteadas por uma promoção,entraram no camarim.
Os produtores,com um português bem precário,orientavam-nas para formarem uma fila.
-No ficar na fila, no ter foto - ameaçava um deles.
Tamires e seu pai obedeceram.Acabaram no fim da fila,o que não incomodou a garota.Acreditava que sendo a última teria mais tempo com seu querido.
Pouco a pouco,as meninas se acalmaram,e apenas as que chegavam até os ídolos se descontrolavam.
Ela observava o comportamento com reprovação.Era diferente de todas,não era imatura,sabia porque estava ali.Quanto mais se destacasse das outras,mais ajudaria o destino.
Desde que ouvira pela primeira vez a música dos Stoplayingplease!,soube que havia algo de especial entre ela e o vocalista,Johnny.
Com tempo e o sucesso da banda,as entrevistas confirmaram que eram almas gêmeas.
Seus gostos musicais e gastronômicos eram idênticos,assim como seus hobbies;suas histórias familiares eram parecidas;seus signos astrológicos combinavam e ela até falava bem inglês.A promoção que participara de última hora e ganhara só confirmava que era o destino.Não via a hora de contar esse detalhe à sua mãe,que achara uma grande bobagem viajar tantos quilômetros e gastar tanto tempo e dinheiro só pra conhecer um menino famoso.Por sorte o pai entendera que o destino precisava de ajuda.Como se conheceriam se ela morava numa cidade tão pequena?
A garota da frente começou a gritar loucamente e Tamires percebeu que só existiam mais três meninas entre ela e Johnny.Seu pai apertou seus ombros:
-Preparada filha?
-Sim!-respondeu com determinação.Procurou no bolso o bilhetinho que entregaria ao amado.Escrevera um recadinho explicando as coincidências,deixara seu telefone,com os códigos que ele precisaria para a chamada internacional,e borrifara no papel um perfume que,numa das entrevistas,ele afirmara ser a melhor fragrância feminina,achava que as mulheres ficavam irresistíveis
Em seguida,abriu a mochila e pegou o espelhinho e o batom.Johnny sempre dizia que não se importava com aparências.Mas ela não podia facilitar,já que teriam uma conversa rápida.A primeira impressão tinha que motivá-lo a ligar.
Duas meninas entre eles.
A da frente parecia ter um ataque de tanto que gritava e pulava.
O estômago de Tamires parecia fazer turismo por entre os outros órgãos e seu coração passara a zunir.
Respirou fundo.Repassou mentalmente a conversa que teriam.Ensaiara com a professora de inglês muitas vezes.
A menina da frente foi chamada.Era a próxima.
Seu pai preparou a câmera.
Suas pernas formigavam e sentia um impulso louco de gritar e pular nele,se declarar.Engoliu.Respirou.
A histérica e os pais bateram a última foto.
-Pode ir- disse o segurança.
“Mantenha a calma e sorria,mantenha a calma e sorria..”,pensava Tamires enquanto percorria o longo metro que a separava de seu amor verdadeiro.
Estava diante dele.Era exatamente como nas revistas!
-Hey John!-conseguiu dizer.
-Hey darling!-respondeu ele e,em seguida lhe perguntou seu nome e onde estava o CD para autografar.
Tamires,completamente abobalhada,disse o nome e entregou o CD.
Ficou parada,apenas observando Johnny escrever um recado de duas linhas completamente comum.Os outros integrantes apenas assinaram em baixo e de repente o CD estava de volta em sua mão gelada.
-Quer tirar foto,Tami?-lembrou o pai
-Ah,sim!-concordou ela,lembrando-se do bilhetinho.Estrategicamente ficou ao lado dele na hora do ‘xis’ e,enquanto a luz do flash acendia,ela colocou o bilhete na mão do amado.
Rapidamente agradeceu a foto e correu.
Assim que parou sentiu-se boba.Achou que perdera parte do momento mais especial de sua vida.Porém teve sorte de,ainda que de longe,vê-lo ler o bilhete.Ficou esperançosa.
Durante todo o show procurou ficar perto do palco,se destacar da multidão,perceber sinais de que ele estaria procurando por ela.Mas nada aconteceu.
Johnny sequer descansou após a apresentação.A banda ainda tinha outro show,em outro país antes de voltar pra casa.Mas ele guardou o bilhete pois gostava dos agrados de fãs.
Dois dias depois chegou em casa.
Dormiu.Curtiu a família,entregou presentes.Saiu pra comemorar o sucesso da turnê.Voltou de madrugada.
Só acordou no meio da tarde.Assim que levantou,tropeçou numa mala ainda esperando pra ser desfeita.
Distraidamente começou a tirar as roupas e do meio delas surgiu um papelzinho rosa.
Era um bilhetinho de uma fã brasileira cujo o nome não sabia falar direito.Ela explicava que apesar dos três anos de diferença,tinham muito em comum.Eram feitos um para o outro.E deixava o telefone.
Conseguia lembrar vagamente dela.Ao contrário das outras não surtara diante dele ou tentara beijá-lo.Era um tipo raro de fã,mas já encontrara algumas assim pela estrada.
De repente notou o perfume.Abriu um sorriso.Ela se dera ao trabalho de procurar a fragrância que mencionara em uma entrevista qualquer.É,não era mesmo uma fã comum.Percebeu que estava sentindo uma mistura de medo e curiosidade por ela.Por segundos cogitou telefonar.
O celular começou a tocar.Era o produtor.Tinha algumas idéias novas,precisavam terminar logo o segundo álbum,teriam uma reunião no dia seguinte...
Enquanto o forte sotaque texano do outro lado da linha lhe explicava detalhes das novas idéias,ele procurou a caixa de recordações e jogou o bilhete no amontoado de esperanças juvenis.Era óbvio que não podia namorar uma garota de treze anos,fanática,que achava que o conhecia apenas por ler entrevistas.
Terminada a conversa,decidiu que a bagunça ficaria para a empregada e foi cuidar de sua vida de estrela.
Há milhares de quilômetros,Tamires adormecia ao lado do celular,muito cansada das noites que passara em claro esperando por uma ligação.
Marie
*Inspirado no artigo 'A necessária desilusão amorosa' de Marion Minerbo,publicado terça-feira passada(12/10) no caderno Equilibrio na Folha de S. Paulo
8 comentários:
legal legal! tem inspiração com alguma história veridica vivida?
saudades de ler textos assim. =)
confesso que o final me surpreendeu um pouco =P
Puuuts esqueci de por de onde ela tirou =/
agora sim =D
Todo mundo deve ter passado por isso, acho que a diferença deve ser que alguns se tocaram sozinhos e outros a vida precisou dar um empurrãozinho.
Muito identificável! 13 anos é uma idade inocente... rsrsr
Gostei da parte "O estômago de Tamires parecia fazer turismo por entre os outros órgãos e seu coração passara a zunir." Bem sinestésico!
=D
Froid deve explicar ...
Eu senti borboletas no estômago junto com o da Tamires. Brilhantemete escrito o texto, Marie.
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