quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Atenção:órgãos na calçada

O dia estava frio e ensolarado, típico de inverno. Parei assim que saí do hotel e fiquei observando a avenida movimentada. De repente, um grito me chamou a atenção. Caída na calçada uma mulher gritava. Tinha os órgãos internos expostos por um rasgo na barriga e derramava seus fluídos na calçada. Era nojento olhar e, ao mesmo tempo, irresistível. Então percebi que as pessoas em volta nem notavam o quanto que ela estava sofrendo, não viam além daqueles órgãos esparramados pelo chão. Senti nojo por toda aquela cena. Como as pessoas passavam tranqüilas com suas capas da imortalidade? De repente uma menina de uns oito anos, que estava na outra calçada gritou: – Mãe! A mulher morreu! –Sim, filha, ela foi atropelada. – respondeu a mãe envergonhada. – Você não vai fazer nada por ela? – Vem, filha! Fica quieta! – Mas, mãe, você disse que... O resto eu não pude ouvir, pois a vaca se afastava rápido com a filha. Aquilo me deixou irado. Peguei o celular e liguei pro pronto socorro, mas ninguém atendia. Resolvi pega-la pra levar ao hospital, a coloquei no meu carro que estava longe. As pessoas ficaram com olhar de espanto, como se eu tivesse feito mal a ela. No caminho do hospital peguei os documentos dela e para minha surpresa ela era uma ex-colega de escola por quem sempre fui apaixonado. E o melhor, não tinha nenhum que mostrasse que ela era casada! Olhei cheio de esperanças para o banco de trás, ela sangrava tanto! Cheguei ao hospital e este estava fechado. Tentei outro e também estava fechado. A mulher já não reagia já tava mais pra lá do que pra cá. – É, fodeu! Levei a mulher pra ponte Rio - Niterói e resolvi fazer dos últimos instantes de sua vida os melhores. Parei o carro, peguei o material de socorro que tinha no porta–luvas e agradeci por ter feito o curso de corte-e-costura. A solução não ia durar muito, mas ela fez uma cara de aliviada. Tentei lembrar das coisas que gostava de fazer. Caminhava para o Rio, ela gostava de lá, gostava da praia. Era minha chance de fazê-la feliz. Tirei do porta-malas a antiga cadeira de rodas da minha falecida mãe, que Deus a tenha! Coloquei Marieta nela e fui empurrando a cadeira, olhando a paisagem. Ela estava fraca demais, então comecei a lembrá-la dos velhos tempos, contei as histórias... Acho que andei durante uma meia hora, quando percebi que ela tinha os olhos fechados. Disse a ela que se me ouvisse desse um gemido ou mexesse os dedos, qualquer sinal. Nada aconteceu. Levei-a de volta ao carro, entrei e parti para a praia o mais rápido que pude. Não podia deixar que ela partisse sem ver o teu querido pôr-do-sol. Cheguei na praia, tirei-a do carro de qualquer jeito e a carreguei nos braços. Paramos quando o mar encontra a areia, o dia estava lindo. O Sol se pondo assim como ela morria. A deitei na areia e disse: – Marieta, abre os olhos! O pôr-do-sol está lindo! Ela levantou as pálpebras devagar, olhou para o horizonte e suspirou. Vagarosamente disse: – Vinícius Ricardo! Você está me enforcando. – não tinha reparado que meu braço estava em volta de seu pescoço. A praia estava vazia, algumas pessoas andavam no calçadão e olhavam curiosos para nós. De repente vi que uns seis garotos vinham em nossa direção carregando gatinhos (um cada). – Ô, tio! Qué um gatinho aê? – Perguntou o mais próximo de nós. Eu disse que queria um, mas pedi para que levasse na minha casa, não sei por que até hoje não apareceu. Marieta gostou da idéia de ter um gatinho (se sobrevivesse) e também aceitou um. Ela estava muito mal, quase não respirava e quando estava quase parando seu coração apertou minha mão e o gatinho, disse: – Enterre o gato... Comigo... – Sim, Marieta! Como você quiser! – meus olhos estavam cheios de água. Iria perder minha amada novamente e dessa não teria como salva-la. – Marieta, eu só não enterro o gato, porque seria muita maldade. – disse tristonho -, mas eu te enterro quando e onde você quiser! – Seu viado, me enterra com o gato...! – Mas... Marieta me agarrou pelo pescoço e disse: – Me enterra com o gato! – Ta certo. – disse com medo. Ela me olhava de um jeito nervoso e desesperado. Tirou uma força incrível do além, talvez fosse o desespero de morrer tão jovem. Suas últimas atitudes não condiziam com aquela garota tão meiga que conhecia. O Sol já tinha desaparecido quando ela deu o último suspiro com aquele olhar maligno. – Marieta! – chorei durante uma hora, agarrado ao seu corpo frio. Olhava pra ela e não me conformava com o sistema, com a ordem natural das coisas e com o fato de que o gato estava vivo e brincando com os cabelos compridos da Marieta! Senti raiva dele e já que ele seria enterrado mesmo decidi estrangulá-lo! Acomodei Marieta delicadamente e o gato subiu em seu rosto! Um desrespeito! Peguei ele com força e quebrei seu pescoço! Cavei um buraco grande na praia com as mãos, chorava muito. Quando terminei já devia ser umas 4 da manhã, depositei o corpo dela no buraco, bem acomodado, ajoelhei a seu lado e, ainda chorando, disse algumas palavras: – Eu nunca vou te esquecer! Nunca! Coloquei o gatinho em cima do peito dela, e tampei a cova, nisso já estava amanhecendo. Fiquei por um tempo olhando o mar indo e vindo. Quando, reparei que a areia onde estava a cova começou a se mexer fiquei assustado e de repente a patinha do gato saiu. Minha primeira reação foi de correr o mais rápido para longe. Estava atravessando a Avenida Atlântica e acabei sendo atropelado. Para minha sorte, fui socorrido rapidamente. No hospital conheci a enfermeira Meire por quem me apaixonei. Casamos e hoje temos quatro filhos, sou muito feliz. Tudo isso graças à Marieta. Por: Lídia, Chu e Gigi.

2 comentários:

Purple-Headed Tang Chasa disse...

É impressionante como da pra ver o toque de cada um no texto .

A parte do me enterra com o gato é muito boa ... ri muito.

lídia disse...

Essa parte é muito boa!
acho que as partes do Chu são as mais reconhecíveis(existe essa palavra?bom,agora existe)
Sem ofensas Chu =]